Do tempo em que nosso pai penteava nossos cabelos compridos e o melhor programa era comer pão, de pé, na padaria.

Do tempo em que o quintal era um grande mistério. Tão grande, que a gente demorava dias inteiros tentando desvendar.

Do tempo em que a nossa avó cantava no sol de domingo e a gente parava para ouvir.

Do tempo em que as cabeças das bonecas moravam no telhado e a melhor diversão era fazer bolinhos de terra.

Do tempo em que a gente fugia no meio da noite, lavava os cabelos na lama e se escondia para comer pasta de dente.

Do tempo em que havia cavalos, cachoeiras e fruta no pé e isso era muito, muito comum.

Do tempo em que a gente tinha uns dois ou três vestidos, iguais, mas de cores diferentes.

Do tempo em que as balas mais gostosas moravam do outro lado da rua.

Do tempo em que eu olhava para minha irmã e pensava que estava me olhando no espelho.

Do tempo em que as mães não escolhiam ter filhos e os maridos não sabiam ser pais.

Do tempo em que a TV ficava horas fora do ar e não fazia a mínima falta.

Do tempo em que a gente comia batom de chocolate, sequestrava cigarras e batizava todos os grilos com o mesmo nome (Maristela).

Do tempo em que a gente estudava tabuada na marra e descontava o nosso tédio em dois amigos imaginários (coitados!).

Do tempo em que as pessoas só nos diferenciavam por causa de uma pinta no nariz e era tão chato receber visitas que a gente se escondia embaixo da cama.

Nesse tempo todo, tempos atrás, sempre fomos nós. Nós duas. Inteiras, pela metade, mas sempre juntas. E isso fez toda a diferença.

Para minha irmã gêmea Chris que, aos três anos de idade, já tinha uma longa lista de pequenos delitos. Todos cometidos junto comigo. ❤️

pt_PTPortuguês